- eu quero tudo o tempo todo - disse a raposa.
- como assim? - perguntou o lobo.
- é bem isso, eu queria um mundo sem homens, mas com galinhas. com um príncipe e com rosas. a angústia é saber que isso não existe. - lamentou a raposa.
- você se contradiz. o príncipe é um homem, tanto quanto o aviador. e você não viveria sem eles, como então pode dizer sobre um mundo sem homens? quem você poderia cativar em um mundo sem homens, só com estas quatro coisas? já teria acabado tudo, minha querida.
- não sei responder a isso. - disse ao abaixar as orelhas. - não sei responder a quase nada, lobo.
- responda-me uma coisa: viveria num mundo onde a existência já está ditada?
- não.
- portanto, nós não temos tanto trabalho a fazer, não é? é só cuidar de não cativar os homens errados e manter em vista a rosa, o príncipe e o aviador.
- parece fácil do modo que você fala.
- não é, eu sei, mas o erro também foi nosso. nós também cavamos tocas sob a terra, ou nos juntamos em matilhas, afiamos nossas garras e dentes quando os vimos pela primeira vez.
- está justificando a violência deles como algo que é culpa nossa? - rosnou ela.
- não, querida. nós nos assustamos com eles tanto quanto eles conosco, mas pense como foi o dia em que viu pela primeira vez teu aviador, por exemplo. não ficou com medo? mas ainda sim, mesmo com o medo, não se aproximou?
- sim, mas porque ele não parecia ameaçador como os outros, que carregam armas. - justificou a raposa. - ele sempre me pareceu gentil, estava no olhar.
- ele carregava facas e instrumentos tão cortantes e dolorosos quanto armas. - ressaltou o lobo - assim o fazem todos os seres. ninguém quer se machucar.
- e ao mesmo tempo, todos querem machucar a todos.